Um dia, fui artista
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Nesta edição do Cronofobia:
Um dia, fui artista
Um dia, fui artista
De vez em sempre eu faço isso: lembro de quando fui artista e por qual razão não sou mais. A fotografia, por exemplo, já foi explorada quando essa newsletter ainda era em inglês:
Encontrei duas tiras que produzi pro Tempos Fantásticos que, por mais que não sejam desenho (e sim, colagens), me fizeram lembrar de toooodas as vezes que eu tentei desenhar e fazer disso um output artístico.
Planejei que fosse uma série — chamada “O que não funciona no espaço”, mas como o jornal entrou em hiato, só produzi as seguintes tiras:
O início
Sempre quis saber desenhar. A primeira coisa que li na vida foi um quadrinho da Turma da Mônica; o primeiro livro foi de uma história (magistralmente) desenhada. Escrevi sobre esse livro também:
O desenho, a pintura e a ilustração sempre fizeram parte da minha infância. Lembro de quando colei oito folhas A4 e desenhei um grande mapa. Inventei aquele país e contava para todos como funcionava a sociedade, como era a economia, a política, a imigração… e eu tinha 10 anos. Loucura total.
Mas, como toda criança influenciada pela educação formal, deixei essa coisa de desenhar para trás. Onde já se viu, desenhar? Eu precisava aprender cálculo, geometria, as capitais dos países e o que significava PIB e EUA e CNPJ.
Eu revisitei o Angelo desenhista inúmeras vezes, mas nunca consegui seguir firme por pura insegurança. Olhando em retrospecto, eu não era ruim. Me faltava prática. Dá pra perceber.
Mas Angelo, e as outras artes?
O título desse artigo é esse aí de propósito. Mesmo sendo escritor desde sempre (e só agora validando isso pois vou receber o primeiro adiantamento de um livro que será publicado), nunca me vi como artista. Para mim, a arte estaria ligada diretamente com a imagem — mais especificamente, com o desenho e a pintura.
Eu sei que estou errado, mas é esse o teor que quero trazer. Escrever, no meio meio, nunca foi visto como arte.
A faculdade de design gráfico
Quando saí do jornalismo, engatei numa faculdade de design gráfico (só durei 7 meses nela). Tive desenho no primeiro semestre e o professor nos obrigava a encher um sketchbook de desenhos. Hoje eu entendo a razão — ficava mais fácil soltar a mente e desenhar qualquer coisa, e até o ruim saía bom.
Teve um exercício bem besta de desenhar o nosso prato de comida com os olhos fechados. Fiz achando que ia sair tudo uma bosta, e a maioria saiu… mas esse prato de frango, tomate, salada, e fritas… ele fala comigo. Não sei porque.
No tempo que não estava utilizando o caderno com os exercícios propostos, estava ocupado inventando qualquer coisa para preencher o espaço — só ganharia nota se houvesse terminado-o por completo, sem páginas em branco. De vez em quando, eu fazia quadrinhos…
… em outros momentos, fazia só tirinhas:
Alguns exercícios começavam sem nenhuma pretensão e, olhando hoje, gosto muito do resultado. Esse, sobre contraste, me deixou tão satisfeito que até hoje levo essa estética dura e com muito contraste para meu design.
Em um dos exercícios, precisava usar um visor — um quadradinho de papel cortado — e apontá-lo para qualquer lugar. O que via no tal visor deveria virar desenho. Esse, abaixo, é o resultado de eu olhando para a parede do meu então quarto. Nela, você pode ver:
algumas fotos minhas — uma quando criança, outra adulto, e outra tatuando;
capas de álbuns que eu colei na parede (sim, colei a capa de plástico dos CDs na parede) — Os três discos do Interpol (até aquele momento) e um do Jamiroquai;
Uma foto do meu irmão com uma placa escrito “perigo”
Uma foto de um amigo tocando guitarra — eu que tirei a foto, adorava ela.
Um bilhete de amor da minha namorada — que virou minha esposa e hoje é, além de ex, amiga.
Para concluir esse momento, digo que não desenhei apenas com nanquim no papel branco. Tenho uma foto de um desenho de modelo vivo que eu queria ter guardado, feito em papel kraft com carvão e giz.
Mutarelli
Fiz inúmeros cursos com Lourenço Mutarelli — de escrita, de desenho, sei lá mais do que. Tomei uísque com ele no seu bar favorito e, pela primeira vez, cheirei rapé na companhia do artista. Eu nem gosto de uísque.
No curso de desenho a metodologia era parecida: desenhar sem parar. Nele, ocupava as páginas do meu caderninho com expressões mais caóticas, misturando desenho com escrita (e notas das aulas do mestre).
Como um ímpeto criativo, uma chamada ao berço, ou um sinal divino, sempre voltei ao quadrinho.
Percebi que a escrita sempre fez parte do meu desenho. Entendi que ser diagramador de jornal tinha muito isso — fazer a escrita ser bonita, e não só um monte de texto jogado na página. Nas aulas do Mutarelli as vezes saíam até uns poemas meio visuais.
De suas aulas, tenho dois desenhos favoritos. Sempre discutia com
que desenhar mãos era insuportável, e resolvi fazer uma ilustração que fosse basicamente isso — um aperto de mãos — num quê meio tattoo old-school, treinando hachuras e — claro — com elemento textual.O outro não é um desenho, mas minha primeira e única experiência com pintura. Comprei três potes de tinta acrílica — preto, amarelo, vermelho. Perguntei à Mutarelli o que pintar e lembro como se fosse ontem: “é mais fácil falar sobre o que não pintar. Pinte o que der na telha, seja bonito ou asqueroso”, disse ele. Foquei no asqueroso e pintei os três quadros da série Pragas.
Ah, foi durante as aulas de Mutarelli que tive a ideia do Tempos Fantásticos. No mesmo caderno de sketches de suas aulas, encontrei esse desenho:
Inktober
Meu último curso com Mutarelli foi meio… traumático. Saí de lá meio de mal com a arte, meio de saco cheio com aquela busca que tinha desde criança, de conseguir me expressar e — porque não — de ter meu trabalho admirado.
Comecei o Inktober algumas vezes, nunca passando de uma ou duas semanas de desenhos diários. Abaixo, dois de 2016 e um outro de algum ano seguinte.
Xilogravuras
Não acho que cabem nas mesma categoria, mas tentei me embrenhar novamente no desenho — mas com mais fisicalidade. Nunca fui bom em artes manuais, como artesanato, costura, escultura. Mesmo assim, resolvi tentar a mão num curso de xilogravura no Ateliê Piratininga.
Não foi apenas uma experiência sensacional, como foi divertidíssimo imaginar uma peça artística, passar um tempão (demora, hein, bicho) cavucando a madeira até ter a matriz pronta, e conseguir imprimir (ai ai amo impressão) minha expressão artística ali, na hora. Da mente para a madeira para o papel.
Infelizmente só tenho fotos das xilos que produzi — e apenas de duas delas, ambas com teor humorístico. É claro que uma delas tem… letras.
Aliás, uma das pouquíssimas postagens que já fiz no app preferido dos jovens foi a impressão de uma xilogravura que fiz lá na Alemanha — e que ninguém quis nem de presente, sequer comprar.
E agora?
Minha intenção com esse texto — além de mostrar meus dotes artísticos, claro — é a de te lembrar que ainda dá tempo de aprender algo novo — e que não há problema em retornar para algo que não deu certo no passado.
Poderia citar Heráclito aqui (bla bla bla não é o mesmo rio bla bla bla) mas vou dizer apenas: tentar de novo é um sinal de vida. É uma prova que há algo aí dentro que quer continuar, que quer evoluir, que quer crescer.
Não sei quando vai ser minha próxima tentativa de ser um desenhista. No último curso que tentei fazer — o famoso curso do Hiro Kawahara — tive crises de pânico a cada vez que encostava no lápis (é sério, eu tinha que me trancar no banheiro. Teve uma vez que eu levante e saí no meio da aula porque estava tendo uma crise e precisava ir embora. Peguei um uber e deixei todo o meu material para trás. Foi uma merda).
Pera, um momento: o curso do Hiro é bem foda, era eu que estava totalmente desregulado. Não é culpa do curso — no melhor “não é você, sou eu”.
Após essa experiência, nunca mais desenhei. Na verdade, perdi completamente o costume de escrever à mão e desenhar no sketchbook. Aqui em casa eu tenho uma pilha de cadernos antigos, e agora estou com o mesmo há quase 3 anos, e ainda tem 70% de páginas em branco.
Mostro à vocês essa faceta e pergunto: qual é sua pulsão artística? Como você exprime isso? Existe um tipo de arte que você tentou, não deu certo, e você tem vontade de voltar?
Rapidinhas
não existe trabalho ruim…
…o ruim é ter que trabalhar, como disse o poeta.
Estou empregado. Em pleno 2024, na área de tecnologia, ter sido contratado no modelo CLT é uma novidade. Nem lembrava como um exame admissional era (e como é um exame bobo). Trabalhei PJ nos últimos 5 anos, então, nem sabia que a CTPS era 100% digital. Muitas novidades.
Ainda estou em experiência, então não vou falar muito sobre onde estou trabalhando — nem atualizei o LinkedIn ainda. O importante é que vou ter como pagar o leitinho das crianças no fim do mês.
Mais Deep Space 9
Continuo na minha missão de maratonar Star Trek: Deep Space 9 — que já virou meu Star Trek favorito. Estou na s05e15 — logo que um certo cardassiano se mostra um grande filho da puta — e continuo animadíssimo.
Mais Dungeon Crawler Carl
Comecei a audioler (continua um termo péssimo) o livro de fantasia, ficção científica, sátira, sei lá o gênero, Dungeon Crawler Carl. Publiquei sobre ele na edição de 1º de Outubro, e hoje, 45 dias depois, estou prestes a terminar o livro 4 da série. Pensando que cada livro tem, em média, 12 horas, eu passei UMA COTA colado no radinho.
Não achei um bom trailer do livro, mas achei um video essay bem legal que passa a vibe do esquema.
Espero que tenham gostado dessa edição e, até a próxima. TCHAU!
Sua trajetória com desenho é parecida com a minha, só que com música. Um dia eu ainda tiro meu teclado do armário de novo
Você não foi, você é. (Adorei saber que você desenhava, eu também carrego esse passado, risos)