Quando disse “não te amo mais”, já não amava há meses.
O fio da espada que encontra essa publicação.
Há meses, por impulso, comprei um curso de produção musical. Pensei que a música seria minha salvação — mas a falta de tempo a tirou de minha mira. Hoje, por impulso, resolvi retomar o curso e percebi que, novamente, estava praticando o que eu chamo (e provavelmente outras pessoas também) de procrastinação criativa.
Ao invés de me afundar em um feed do Instagram, vou mergulhar num curso de 80 horas sobre algo que eu não to fazendo agora. Eu não produzo música tem uns 10 anos, sabe?
De qualquer modo, é melhor do que fazer o que eu PRECISO fazer, como por exemplo, dar um fim à essa newsletter.
Digo “dar um fim” não no sentido put it out of its misery, mas sim no sentido de dizer o que vai acontecer — pois coisas irão sim acontecer. Tudo irá mudar, e eu já fiz as pazes com isso há um tempo e acho que vocês merecem saber.
Carrego em meu peito uma correntinha com a carta da torre do tarot. Essa carta significa, isoladamente, o fim absoluto e repentino. É a queda, a destruição, a erupção, o botar fogo e jogar sal na terra. Acabou e ninguém avisou que acabaria. Me dou muito bem com o luto.
Descobri que demoro para anunciar os fins ao meu redor mas que, quando tomo coragem de dizê-los, esse barco já partiu. Não há discussão — ela já aconteceu em minha cabeça, por mais injusto que isso seja.
Quando disse “não te amo mais”, já não amava há meses.
Sentado em um café no centro de São Paulo — pertíssimo de um apartamento em que morei por anos — escutava da boca de uma grande paixão que ela não tinha mais interesse romântico em mim. Ela adoraria ter proximidade, intimidade, comprometimento, mas tudo em uma embalagem de amizade e não de romance.
Eu disse que tudo bem — afinal, tudo bem mesmo. Minha vida na não monogamia e anarquia relacional me ensinaram muita coisa, e a mais valiosa delas é que a amizade importa mais que qualquer vínculo romântico-sexual.
É óbvio que ouvir, em tradução livre do português para ansiedade, “já não te amo mais”… é destruidor. Todas as expectativas e esperanças são jogadas de lado e um série de protocolos são criados para que os sentimentos sejam forçados a mudar — meus divertidamentes já apertavam todos os botões necessários para que eu deixasse de amar instantaneamente, tal qual uma escavadeira descendo o cacete em uma casinha fofa de vó que vai virar um prédio superfaturado em Pinheiros.
Na prática as coisas não funcionam assim, eu sei, mas me dou muito bem com o luto.
Dou o caralho. Adoro contar essa mentira para mim mesmo, e vou continuar fazendo-o pois preciso estar acostumado com o luto. As coisas acabam, de repente ou não, então melhor eu estar preparado, né?
Tenho muito, mas muito interesse mesmo na amizade dela, só vai ser difícil não querer enchê-la de beijos. Isso vai mudar com o tempo, eu sei, não é minha primeira vez.
Já ouviu falar de paralisia da escolha? É quando tem tanta coisa no menu que você não consegue escolher nada por medo de ter escolhido errado.
Em minha pesquisa sobre o que caralhos eu quero fazer com essa newsletter, cheguei na seguinte lista de assuntos que gostaria de tocar: jogos, filmes, literatura, música, filosofia, tecnologia e novidades sobre minha vida — ou seja, basicamente um podcast de homem cis branco.
Não acredito que existe interesse nesse montão de coisas que quero falar, afinal, a função de minha mente em minha vida é de me colocar o mais pra baixo o possível. Luto contra meus pensamentos intrusivos e continuo a nadar.
No fim, entro no parafuso da paralisia de escolha e não escrevo sobre nada do que quero escrever — exceto o meta, ou seja, falar sobre “falar sobre”. Já é a quarta (?) edição que escrevo sobre o futuro dessa newsletter e, veja bem, ele nunca chega.
Bem.
Chegou.
Minha síndrome do impostor diz que ninguém liga para as coisas que vou escrever aqui, mas sei que você se interessa pelo backstage da produção dessa joça, né? Então vem comigo.
Decido, agora, que À Revelia vai acabar. Não se desinscreva ainda — vou usar esse canal de comunicação para apontá-los para minha próxima empreitada. Vou sim tentar escrever sobre esse montão de coisas que disse acima, mas de outro jeito e em outra newsletter. Quero, por exemplo, voltar a escrever em inglês sobre algumas coisas e também investir um tempo em artigos mais técnicos.
Não quero, porém, poluir a caixa de entrada de ninguém com textos sobre renderização via servidor de conteúdo dinâmico em NextJS, e nem encher o saco com textos sobre videogames se você não gosta de videogames. Haverá uma seção, por exemplo, sobre o making-off dessa news e de outros projetos, só para quem gosta dessas coisas mais mão-na-massa.
A primeira coisa que farei aqui será a de desligar a monetização. Minha única assinante colocou dinheiro no meu bolso para que eu continuasse escrevendo e, nesse momento, não há razão dela continuar pagando.
Porém a monetização não vai acabar. Em uma sessão de terapia de muitos anos atrás, perguntei ao meu psicólogo por qual razão eu achava tão importante cobrar pelo Tempos Fantásticos, e ainda assim brigar para que ele tivesse um custo acessível. Ele sorriu e disse: é gostoso quando as pessoas confirmam que gostam do seu trabalho dando dinheiro em troca dele, né? Em suas palavras: “a prisão do capitalismo é uma sala acolchoada. Não bater a cabeça no concreto frio é um benefício, não um direito básico”.
Provavelmente vou continuar no Substack, provavelmente vou criar uma seção para cada tema — e aí você se inscreve em qual quiser — e provavelmente vou trancar alguns artigos atrás de um paywall. O tempo dirá.
Se essa experiência da newsletter não era amor romântico, que vire amizade, e que se torne uma amizade longa e frutífera. Será um privilégio ser amigo dela novamente.
Oi Angelo! Fiquei curiosa... qual a sua motivação por trás da newsletter? Não sei se meu pensamento é romântico demais, mas talvez a motivação em si seja mais importante do que a temática e talvez te ajude a não procrastinar criativamente (adorei essa!).
E achei curioso: mesmo não amando mais (ou desistindo da opção paga), ainda veio um lembrete para fazer upgrade 😅