Projetos achados & perdidos
O que deixamos para trás, o que ainda é nosso, o que virá por aí
Nesta edição do Cronofobia:
Projetos achados & perdidos
Ozark
The Boy and the Heron
Teenage Mutant Ninja Turtles: Mutant Mayhem
Tempo de leitura: ±8 minutos
Projetos achados & perdidos
Prólogo
Esses dias recebi um email que perguntava se eu queria gastar uma quantidade de reais para renovar o domínio www.cronofobia.com.
Antes, deixa eu explicar pros leigos: quando você quer ter um site, você compra um domínio — esse endereço aí que você digita, tipo facebook.com, substack.com, ou pudim.com.br. Esse endereço então aponta para um lugar mágico na internet que tem os seus arquivos, e ele mostra tudo o que tiver ali pro mundo.
Na época (em 26 de maio de 2018, link do primeiro commit), criei uma loja online para vender (no sistema “pague quanto quiser, ou seja, até ZERO reais) os zines que produzia, e apontei o domínio para lá. Desde então, eu tive outros projetos com esse mesmo nome, como meu podcast quase diário e, bem, essa newsletter.
Resolvi então mudar as coisas. Joguei o site de zines para zine.cronofobia.com e essa newsletter agora aponta (veja lá na sua barra de endereços) para www.cronofobia.com.
E esse processo todo me levou pro tema dessa edição.
Desistir é uma delícia
Grecia escreveu sobre como desistir é importante e eu concordo em número, gênero, e grau. Já desisti de muito projeto nessa vida — alguns por falta de paciência e outros por pura frustração. A própria newsletter já foi e voltou por anos — até essa última iteração, (quase) firme e (um pouco) forte pelo último ano.
Só de ideia de livros, rapaz, quanta coisa já foi pro lixo. Exemplos:
A história do explorador do século 19 descobrindo um novo continente na nossa Terra, pique H.G. Wells;
A aventura do entregador dos Correios no século 22 através do braço da Via Láctea controlada pelo Brasil, pique Douglas Adams;
O jornalista do Tempos Fantásticos investigando uma conspiração extradimensional, pique… bem, pique Angelo Dias mesmo.
A desistência dos livros sempre foi por conta dos mesmos motivos: falta de tempo (questionável), falta de habilidade (questionável), e ansiedade paralisadora (difícil de questionar quando você tá chorando de cócoras). A ideia de começar um projeto desse tamanho, com isso tudo de trabalho, com a promessa nula — quase negativa! — de qualquer retorno (financeiro ou não) faz qualquer pessoa normal largar o osso — imagine alguém que é um poço de ansiedade?
Porém, na mesma toada, andei com o podcast quase-diário por… porra, mais de 500 episódios. Zero retorno — exceto por quatro ouvintes fieis que mandavam um “vai fundo!” na DM. Engraçado como dividir uma tarefa em pedaços pequenos realmente faz a gente mandar ver na produção com muito menos nervosismo, quem diria né?
Se os livros são exemplos de coisas que eu nem comecei e o podcast é algo que eu comecei, fui longe, e desisti frustradíssimo, há também aqueles projetos que só… morreram.
Cartas pra sua mãe
Um dia resolvi fazer uma idiotice.
Escrevi 10 cartas à máquina como se fosse um explorador do século 19 (sim, a mesma ideia do livro) descobrindo maravilhas em um novo continente não explorado. Pedi o endereço dos pais de amigos e enviei as cartas para eles — sem dizer nada além do “meu grande amigo Angelo está me ajudando com esse processo, respondam essa missiva à ele”.
Recebi zero respostas.
A maioria dos amigos não sabem se os pais receberam as cartas ou qual foi a reação deles — não sei se eles leram, acharam besteira, e jogaram fora; ou se eles nem ao menos receberam.
Fui burro: não tirei uma foto sequer de nenhuma das cartas (ou seja, quando eu morrer elas estarão valendo milhões, estilo Tolkien) então só tenho esse projeto — que nasceu, foi comprar cigarro, e nunca mais voltou — na memória.
Cronofobia Zines
Quando criei o site, me baseei no Panel Syndicate, site do Brian K. Vaughan (roteirista de Lost, a HQ Saga, e outras obras fodas). Nele, o leitor pode pagar quanto quiser pelos quadrinhos — até mesmo zero, Null, grátis. Queria oferecer a mesma coisa para as pessoas: quer ler minhas zines e não quer/pode pagar? Foda-se, toma aí os PDFs, divirta-se.
Quase toda edição tinha uma brincadeira para engajar os leitores. Nunca recebi uma resposta. Clique nas imagens para vê-las sem corte.
(Caralho bicho, QUE SAUDADES de fazer zines)
A questão é que, na época, eu produzia zines — e adorava fazê-lo. Cheguei a dar uma oficina em uma escola do estado, participei de feiras de impresso (num momento pós Tempos Fantásticos), e constantemente pensava “isso aqui daria um zine”. Só que… parei.
Mais uma vez o pensamento vinha: qual o retorno? Na loja virtual tive cinco vendas, enquanto na presencial só consegui vender junto com a obra de outros colegas — como brinde, ou extra. O pior? Tive menos de 20 downloads grátis, na média, dos zines. Se a galera não quer nem de graça, to fazendo por que?
Que deus me acompanhe
Não vou falar muito disso aqui — já falei em outras edições — mas já fiz muita música no passado. Compunha pra caramba, tinha banda, fazia sons maneiros… mas tudo bastante cristão. Mesmo. Para quem não sabe, eu tive uma banda cujo gênero é “música cristã para adolescentes”. Duvida?
Na banda, além de compor e às vezes cantar, eu tocava escaleta, um tipo de tecladinho de sopro com esse som meio gaita — o que faz a melodia principal nessa canção aí — e um glockenspiel — um tipo de xilofone de metal.
Para um pouco, deixe cristo de lado, e dá uma atenção na letra. É divertida, pô. A gente tinha coreografia pra todas as músicas, e sempre chamava um ou outro fã pra danças — e a gente tinha fãs! A gente já foi (de SP) tocar no Rio de Janeiro a convite de uma igreja de lá.
As músicas, temáticas, tinham origem no acampamento evangélico que (pasmem) fui membro por 13 anos. Essa próxima, por exemplo, tem temática futebolística. Olha que letra divertida!!!!!
Se o meio campo pega a bola e não tem pra quem tocar
Na armação da sua vida, cristo quer jogar
Vista a camisa da verdade, então
Não seja bola murcha, seja um campeão
Vai, dá pra dar um sorrisinho — se você tirar todo o contexto religioso, e pensar que “jesus cristo” aí da letra é, sei lá, um personagem fictício — cante “Tom Bombadil” no lugar e pronto.
Pra acabar com essa exposição gratuita desse projeto que tem zero a ver com minha vida atual, segue a música que eu não só compus como também cantei.
Sim, eu compus uma baladinha melodramática.
Chega de evangeliquês, deus me livre, sangue de jesus tem poder.
Além dessas aventuras, publiquei umas coisas beeeeem diferentes lá no meu soundcloud. Essas músicas todas tem, sei lá, uns 8 anos. Se quiser ouvir, tá aqui o link.
Videocalhau, meu canal no YouTube
Sim, eu tive um canal no YouTube.
A ideia era ter dois programas: um sobre qualquer coisa e outro fazendo entrevistas com pessoas normais, gente como a gente.
Registrei coisas divertidas, tipo um dia que um amigo meu tatuador foi lá em casa fazer tipo sete tatuagens e eu resolvi entrevistá-lo durante o processo. Antes que critiquem: a gente era novo, por favor não julguem nossa total falta de higiene. Hoje Douglas é um puta profissional que nunca mais toparia algo desse tipo, podem confiar.
No programa tradicional falava sobre o que desse na telha. Por exemplo, em certo momento resolvi falar sobre coisas francesas que estava curtindo na época.
Em outro, recomendo a excelente série Spartacus:
E, em outro momento, fiz um curta-metragem com temática “aquelas redações de ‘minhas férias’ da escola”. Completamente outra coisa — roteiro, montagem, ritmo… totalmente diferente.
Enfim, cansei. Editar vídeo dava um trabalho desgraçado e não conseguia me ver com tanto sucesso quanto um youtuber pica da época — falta de autoestima? Talvez.
Conclusão
Desistir é bom. Faz parte da vida. Fico feliz que consegui manter registro de (quase) todos esses projetos, e tenho registrado os mais recentes com mais competência.
Reconheço que o problema, no fim das contas, é esse pensamento parasita, que me destrói, e que ainda continua ativo.
Deveria fazer zines, vídeos, música, porque eu quero… mas faço porque quero que a galera curta. Sem massagem, essa é a razão que eu faço todos os meus projetos — ou você acha que essa newsletter tá aqui só pro meu bel prazer? Tolinho.
Não sei como me desprender dessa ideia, e escrevo essas palavras pensando “quantos likes vale essa newsletter? Quantos comentários? E será que alguém vai compartilhar?”.
O próximo projeto bem perto da desistência completa é o próprio Tempos Fantásticos — já são 3 anos tentando publicar o livro que compila todo o material, por exemplo.
Essa newsletter… ainda tá dando pano pra manga. Sabe o que ia fazer eu pensar cada vez menos em parar com ela? Com um pequeno sacrifício financeiro da sua parte (perdão 🤑) você consegue me manter engajado (e ansioso, pensando “tão me pagando, preciso produzir!!!!”).
Rapidinhas
Ozark
Depois que meu irmão insistiu muito, comecei a série Ozark, estrelada, produzida e com vários episódios dirigidos por Jason Bateman. O engraçado é que eu tava tentando ver Arrested Development, uma série de comédia também estrelada por Jason Bateman.
Eu estava odiando Arrested Development e queria um bom motivo para largá-la e, bem, Ozark é o completo contrário de AD. Em uma, a família é um bando de picaretas que se odeiam mutuamente; já em outra eles são criminosos profissionais e se apoiam em todo momento. Em uma, o sentimento que prevalece é a vergonha alheia absurda; já em outra a tensão é tanta que não consegui destrancar meu cu por 3 episódios seguidos.
Desisti de Arrested Development e to indo fundo em Ozark. Quando acabar volto aqui para falar.
The Boy and the Heron
Já assisti 19 dos 24 filmes do estúdio Ghibli, sendo o décimo-nono o mais recente, sobre um moleque que perde a mãe num incêndio, vai morar na casa da nova esposa do pai, toma um montão de ácido sem querer e tem a maior viagem psicodélica já filmada desde Enter the Void.
Que. Viagem. Da. Porra.
The Boy and the Heron é lindíssimo do começo ao fim, com cenas que fazem o queixo cair, porém é uma viagem lisérgica que passa um pouco dos limites da minha expectativa. Tá certo que o meu favorito ainda é Viagem de Chihiro (com O Conto da Princesa Kaguya em segundo lugar) , que é, como diz o nome, uma puta viagem… mesmo assim, The Boy and the Heron pesou um pouco a mão. Meti 3,5 estrelas no Letterboxd.
Teenage Mutant Ninja Turtles: Mutant Mayhem
Fui coagido pelos meus irmãos adolescentes a assistir a animação TMNT: Caos Mutante, com de novo a história de origem das tartarugas ninjas e uma missão em que eles tem que salvar o dia.
Aí o filme me deu uma rasteira e eu saí dele embasbacado. Que puta filme.
Não só os personagens são carismáticos pra caramba, ele tem um recurso de roteiro que faz você empatizar demais com os vilões. A “A-Story” é meio clichê, mas a “B-Story” é tão massa que acaba subindo em cima de tudo. Vale a pena demais, além de ser bonitaço. 5 estrelas sem cair um pingo de suor.
Por hoje é só. Espero que tenha gostado e até a próxima.
Existe um certo conforto em abandonar algo que não nos serve mais. Ao mesmo tempo existe o problema de querer construir sempre num sistema no qual você dificilmente vai sentir que faz o bastante. A dificuldade é discernir o que é seu e o que é pressão externa.
Abandonar faz parte do processo também, né. Eu já tive um blog com uns 5 mil assinantes e apaguei tudo, simplesmente pq não condizia mais com quem sou hoje. Achei que poderia me atrapalhar profissionalmente.
Eu assisti Ozark e adorei!